18 de dez. de 2011

A etérea


Existe um rio de calma em ti.

Circula sobre ti um céu anilado

Um bocejo sem pressa

Um riso agraciado.

Os modos de você se portar fixam sua personalidade genérica

Na sua geometria exponencial de ser.

Você tem no corpo a essência dos bálsamos do mar,

o cheiro saboroso do limão

- Em você todos os pensamentos que me inspiram sublimição.


Wellingto Liberato dos Santos
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27 de nov. de 2011

Desengavetar

Antes os textos eram datilografados e guardados numa gaveta. Eram os engavetados, lido, relido, apresentado a um amigo que geralmente não opinava e quando opinava dizia: os textos são bons, demonstrando desinteresse súbito ao mudar de assunto. Ficava então os textos e quem os produzia sufocados naquele mundinho.

Com o advento da Internet e dos microcomputadores, as páginas físicas foram substituídas pelas virtuais, as máquinas de datilografia pelos teclados e os editores de texto, as gavetas pelas pastas, proporcionando outros recursos para os jovens escritores. Graças a ela os engavetados não ficam à mercê da opinião dos desinteressados, mas podem ser publicados por meio de blogs e sites para que todos possam ler, opinar e partilhar nas redes.

Cabe a cada escritor buscar conteúdos originais e criativos para receber visitantes e, quem sabe, ser encontrado por alguma editora que se interesse por sua escrita. Desengavetar é necessário.
Recomendo apenas aos que pensam em desengavetar que se preocupem com a escrita, ponha emoção, criatividade e busquem um visual agradável em sua página para que os leitores virtuais não desistam no primeiro momento.

Desengavetar é o verbo que precisa ser dimensionado nas vidas de quem ainda tem receio de expor a escrita e a sufoca nalgum diretório.
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14 de nov. de 2011

Miserável foi o amor

Eu irei me recolher no meu próprio sofrimento

E me calar para o amor.

Não irei me refugiar no silêncio mais frio e baço dos teus olhos feito menino pidão

E procurar no chão por uma formiga.

Não irei me oprimir. Se o meu mundo estiver prestes a estourar, que estoure; mas sem mim.

Irei me encolher nas ideias para não mendigar nas úmidas ruas de inverno por esse infeliz amor.

Cadernos, 1999.
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7 de nov. de 2011

A pressa e a prece

Olhou para o relógio azul de ponteiros vermelhos e números pretos que estava na parede branca da casa. Quando se deu conta, as horasões contínuas estreitaram seu tempo, fazendo-a apressar o coração, os passos e a ansiedade.
— Já vai mulé? Tá cedo!
— Tenho que ir. Tenho umas coisas para cuidar.
— Obrigado pela visita. Quando vem passar um final de semana com a gente?
— Qualquer dia desses. Quando sobrar um tempinho eu apareço.
— Minha amiga, não se torne uma xepa. Para que tanta correria. A vida estar passando e é tão curta. Sua correria vale a pena? Pense um pouco nisso.
— Não se preocupe. Próximo ano estarei mais aliviada. Se Deus permitir, a gente ainda vai se ver muitas vezes, colocar os assuntos em dia e relembrar as nossas andanças de solteirice. 
 — Tchau!
 — Tchau!
E  o relógio simplesmente continuou com o seu tique-taque e Maria fechou a porta pela última vez para a amiga, lembrando-se da pessoa alegre que era, mas sempre apressada, tomando aquele café ligeiro.

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26 de out. de 2011

Mover e mover

Era café e leite no assento da praça

Com carícias e beijos afogueados

Sob o sol fatigante

Envolvidos e abafados no tempo.

Noutra parte o mundo se movia

Com as palavras, com os pés,

Com os gestos, a respiração, o riso

E o coração.

O mundo se movia nesta parte e noutra

Com o barulho, com os sons,

Com o vento, as folhas, as mãos

Na minha vista.
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20 de out. de 2011

Dualismo entre as vassouras

Esses dias, por meio das redes sociais, parte da sociedade se mobilizou para protestar contra a corrupção. Essa mobilização ficou conhecida como a manifestação anticorrupção. Toda e qualquer tipo de manifestação dessa natureza é válida, mas imatura porque vivemos um dualismo eleitoral.

Não se pode fazer reivindicações de valores e de direitos quando no seio delas há contradições. Explico: recentemente a pesquisa da Fecomércio – RJ revelou que as classes que mais consomem produtos piratas são as A e B. Ao invés dessa sociedade se organizar e exigir que os impostos dos produtos originais sejam diminuídos, prefere praticar conscientemente o ilícito. Essas mesmas pessoas enchem a boca para criticarem com veemência os atos de corrupção.

Tanto a pirataria como o comércio eleitoral é uma prática visível e presente em todas as classes sociais deste país. Se formos fazer uma lista do dualismo eleitoral praticado pelos eleitores, principalmente no período eleitoral e pós, não caberia nesta página. Entendo que antes de os cartazes serem expostos, pintarem as caras, porem narizes nos narizes, apregar vassouras nas praias, enfrente ao Congresso, se organizarem através das redes; é necessário que se faça uma reflexão profunda dos valores e das práticas políticas de cada um.

A sociedade deveria se organizar não somente para combater a corrupção vista de cima, mas a que é praticada por baixo e que não é mencionada pela mídia, nem por essas manifestações.

Antes de alguém pegar uma pedra, saibam que não sou a favor da corrupção porque ela é uma prática mesquinha e criminosa; mas não dar para viver de hipocrisia. A barganha é um fato, assim como é fato a candidatura de candidatos com vida pregressa maculada que se elegem e reelegem.

Não se faz política neste país. Faz-se negócio. Por isso há muita gente no Congresso, nas Câmaras municipais e estaduais desinteressada em legislar. Gente que percebeu que a politica é um grande negócio. Aquilo que muitos chamam de corrupção não é vista como crime por eles, apenas o resultado de investimentos em campanhas eleitorais, cabos eleitorais, eleitores e outras coisitas.

A partir de 2012 haverá eleições para prefeitos e vereadores em todo o país. Muitas caras se repetirão e outras serão substituídas, mas a conversa é unânime: quem dar mais ou o menos pior serão eleitos. Poucos são os homens de vida pregressa imaculada que irão disputar um pleito. Se forem eleitos sem a mercantilização do voto honrarão os seus mandatos, mas se eleitos forem com a maldita compra de voto saibam que os vícios irão minar os seus valores e ideais.
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9 de out. de 2011

Sophós e o chinelo de dedo

Estava Sophós observando as nuvens se tornarem farrapos e o sol cagando para o mundo. Neófito apareceu, dispersando as suas reflexões. Sophós permaneceu em silêncio, intensificando a palidez da face dele. Sem desistir, principiou este diálogo:

— Sophós, estava eu pensando a respeito da palavra crente e resolvi perguntar a Aurélio. Ele me mostrou vários significados, mas foi o de sentido religioso que mais atraiu a minha atenção. Você, o que diz a respeito disso?

— Ora Neófito, a gente deve ouvir a opinião dos outros, acreditar nela ou duvidar. Quando a gente duvida, devemos procurar outras opiniões. Nessa busca a gente rejeita ou aceita ideias previamente estabelecidas. Recomendo que sempre esteja atento ao que se passa em sua cabeça e que sempre duvide, busque as opiniões, investigue e formule as suas próprias. Analisemos, por exemplo, a palavra crente: se ela for precedida de um determinante será substantivo, significando aquele que acredita. Mas quando essa palavra qualifica o sujeito de uma oração, trata-se de uma pessoa piedosa, religiosa. Esse é o significado mais comum, usual. Mas quando se pensa na dimensão dessa palavra, notamos que até os descrentes é crente naquilo que eles acham que seja verdadeiro, excluindo de suas crenças os conceitos religiosos. Fundamentado na anterioridade, defino que crente é qualquer pessoa que crer em algo, alguma coisa, livre de ideias e conceitos preexistentes, tomando como instrumento de suas análises a compreensão do conhecimento e o contexto em que ele estar inserido.

— O que seria a compreensão do conhecimento? Essa ideia para mim é nova. Nunca ouvi antes!

— Vivemos a exposição do conhecimento. Ela é diversa e abundante. Ocorre que essa exposição é mal aproveitada, melhor dizendo, compreendida porque a maioria das pessoas assimila horizontalmente determinadas partes do conhecimento simplesmente para lhes atender necessidades imediatas, sem pensar filosoficamente no conhecimento que se esconde nas palavras. Quando uso a expressão compreensão do conhecimento me refiro ao desprendimento do discurso ideológico, da busca da compreensão da leitura vertical para que as pessoas assimilem e formulem as suas próprias opiniões; tornando-se críticos ante a variedade de leituras as quais estamos submetidos.

— Sophós, escute este fato: estava outro dia, na pracinha que fica defronte a igreja matriz e certo senhor olhou para o filho e lhe disse duramente: “Rapaz, tire esta barba, porque você tá parecendo um marginal.” Diante dessa narrativa, há ou não a compreensão do conhecimento?

— Todo discurso para ser compreendido deve ser analisado levando em conta o contexto. Se você atentar diligentemente para este pai, notará que ele se apropriou de um discurso para expressar o amor que sente pelo filho.

— Não posso concordar com você porque esse filho há de viver aquelas palavras frustrante e ficará revoltado, triste, cabisbaixo e poderá perder o afeto, feição natural pelo pai, extravasando a sua revolta por aí.

— Neófito, a insipiência vista por um insipiente cria violência. Literalmente a expressão é dura, porém observe: para esse pai, o homem sem barba é o homem de bem, aceito pela sociedade. O homem barbudo se assemelha com os marginais. O que o pai fez foi uma comparação, tentando impor sua autoridade sobre seu filho. Isso ocorreu porque não houve diálogo com esse filho. Se o filho estiver ao mesmo nível de ignorância do pai; certamente existirá conflitos externos e internos. Todavia, o pai exprimiu amor, zelo, carinho de uma maneira desordenada. A fala daquele pai demonstra duas coisas:

1ª – O pai se utiliza de um discurso pronto, acabado, que ele aprendeu em sua juventude e dele não se desprendeu. Para ele o querer impositivo é a maneira de opinar sobre determinados assuntos ou solucionar problemas, deixando de lado o diálogo;

2ª – Estar claro na fala dele a ausência da compreensão do conhecimento porque não se buscou compreender as consequências que aquela fala poderia trazer.

Atentos nas idéias, foram pegos de supetão pelas lágrimas da filha de Neófito que, ao se aproximar do pai, desmaiou. Mais tarde Sophós soube que a esposa dele havia falecido.
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