3 de jul. de 2011

Os prefeitos, a folha paralela e os cognatas

Nas cidadezinhas, os prefeitos quando estão em apuro financeiro (nunca deixam de estar) costumam dizer que “não tem dinheiro”, que “os repasses diminuíram” e vão empurrando a administração com a barriga, digo: com a língua e remendos.
E assim vivem eles: um tapinha nas costas num dia, óculos escuro noutro, notas frias ali, vereadores passando no bolso por aqui. Mas as cidadezinhas continuam as mesmas: prestando serviços públicos devagar, faltando-lhes as bananeiras e os burros de Drummond.

Essa falta de dinheiro que a maioria dos prefeitos dizem que “não tem” é justificada por vários motivos. Um deles é tão comum, tão familiarizado que todos praticam-no: é a folha paralela.

A folha paralela é uma folha política, a parte; ajeitada por causa dos compromissos eleitorais. Para mantê-la, eles negam reajustes salariais a servidores e prestam serviços públicos sem qualidade. Assim estar distribuída: para os cabos eleitorais, polícia, parentes, amigos, financiadores de campanha (agiotas, comerciantes etc), o bolsa semanal, os contratados, servidores públicos apadrinhados e há situações em que membros do Judiciário fazem parte dela. A folha paralela é um problema político longe de ser resolvido, graças a mercantilização do voto.

Além dessas coisas aborrecentes, há os infelizes cognatas. O cognata é o papagaio do político. Ele repete aquilo que ouve dos prefeitos, deles adquirem alguns hábitos, acham graça em tudo o que dizem e sempre procuram, de uma forma ou outra, justificar as falhas administrativas e pessoais deles. Estão em todas as partes, em todas as classes e deles não se exige escolaridade. É apenas um animalzinho, nada mais.
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18 de jun. de 2011

A serva


Quando percorreu as linhas horizontais do bilhete, notou a deficiência da grafia, da ortografia, do ensino fundamental. Eram dizeres rústicos, pueris, seguidos de entusiasmo e contentamento. Tratava-se de mais uma na infinita lista da libido.

Nele estava pedidos de desculpas, lamentações de um encontro realizado amargo; simplicidade amarela. A esperança não adornou mais o eu, murchou, caiu. Sentimento de culpa, pedido de entendimento. As palavras não explicavam o código. Uma saudação carinhosa.

Ela dizia: “ (...) eu gostaria...o que eu...eu jamais vou esquecer...quando eu chegar (...)”. Estas eram as palavras de quem desconhecia seus próprios sentimentos, utilizando de vocábulos espontâneos; emergido do íntimo.

Apesar de as palavras serem escritas com tinta azul, eram tortas, tontas, avermelhadas que expunha o ser vestido de carne no papel, vindo com ímpeto de dentro para dentro... Uma pintura na íris.

— Você está partida em pedaços. Tenho nas mãos os sentimentos e a linha para coser a roupa das lágrimas. Um hálito suave ameniza a perda. As cicatrizes trarão aos olhos as lembranças.

Mas o insistia: “(...) te adoro...muito bom...encontra com você... o que cinto... não...escrever...gosto de você...demais...tchau...beijo....abraço....ass...” esqueceste do “S” e fizeste cinto, que te aperta de uma só vez, várias... o teu nome é um sigilo cardíaco nas asas do pássaro e na liberdade do vento.

Guardarei com afeto natural o teu estado de emoção. Olharei as linhas verde das folhas e verei escrito nada a teu respeito. Este é o meu sigilo verde, mudo.
Outubro de 1997.
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8 de jun. de 2011

Creditados

O povo estar desacreditado, por isso, barganha o voto.

O desacreditado é a pessoa que perdeu a confiança. No contexto político diria que o eleitor desacreditado perdeu primeiramente a confiança em si, substituindo-a pelo desânimo, pela passividade ante os acontecimentos e, ao invés de reagir, preferem a “cultura” da impiedade, do jeitinho, da facilidade. Falta na maioria do eleitor brasileiro o interesse pela política. E o seu desinteresse é daninho para todos.

A população de desacreditados não tem face, nem classe social, nem escolaridade. Exterioriza a sua insatisfação pessoal e coletiva quando lê ou assiste ao estardalhaço midiático desse ou daquele gatuno. Como não vê os políticos irem para a cadeia ou devolverem aos cofres públicos o dinheiro desviado para outros fins, reclamam deles, do Judiciário. Criticam-nos e a maioria ainda dorme sem ser a Adormecida.

Como essas práticas são contínuas e a impunidade é o mel da mancebia política, o eleitor brasileiro apenas se sente um elemento dessa população, vencido, desgarrado; pois, associa as práticas de corrupção e abuso de poder somente como práticas ilícitas sem perceber que elas estão entrelaçadas ao comércio eleitoral tão comum nas cidadezinhas e bairros dos grandes centros.

E se convenceram que devem barganhar porque não mais acreditam naqueles que se candidatam, pois, todos que ocupam cargos eletivos se corrompem ou irão se corromper. O problema é que o eleitor, assim pensando, estimula não só a prática da corrupção; mas abre a porta para que todo tipo de pessoa se candidate, compre “[1] (...) o poder que emana do povo (...)”.

Por isso digo: a maioria não vota pela análise. Vota pelo impulso, pela corrupção (a maldita compra de voto), vota sem compreender o sistema político, aceitando-o como se um hábito fosse. Para quê? Para reclamar.

[1] CF. Art. 1º, parágrafo único.
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3 de jun. de 2011

Bisonho literário


Desde os 18 anos de idade que rabisco alguns versos, aventuro-me na crônica e contos. Venho nesta teima: das linhas dos cardenos, das pontas das canetas para o Word e os dígitos. Essa teima já me rendeu três livros, três antologias, alguns textos publicados na imprensa local e péssimas frustrações.

A primeira delas ocorreu em 2003. Por meio de um jornal, desses que se intitulam literário, denominado Jornal Cultural Mensageiro conheci uma “editora” denominada Opção 2. Ela oferecia serviços de impressão com tiragem mínima de 50 exemplares. Ao ler o anúncio, meu entusiasmo literário emergiu.

Com posse do dinheiro em mãos para pagar a edição do livro, convidei mais escritores do município para participarem da Minicoletânea de Escritores Colegienses. Os textos ficaram sob a minha responsabilidade. Eu os “organizei” e os enviei para essa “editora”. Ora, eu era um noviço no assunto. Não conhecia a dimensão jurídica, muito menos comercial a que estar sujeita a publicação de um livro. Mas meu “editor” com aquela ideia pueril que os textos dos autores são intocáveis não opinou sobre a capa, sobre o miolo, muito menos sobre ISBN, Ficha Catalográfica, Depósito Legal. A única coisa que ele me perguntou por telefone foi se eu havia feito à correção gramatical. Ora, sem experiência alguma ou formação na área, apenas lhe disse que havia dado uma olhada; mas não imaginaria que ele confeccionasse o livro da forma como eu o havia enviado.

No prazo estimado pela “editora”, o livro chegou. Melhor dizendo, um livreto. A princípio fiquei alegre, até porque meus escritos estavam impressos. Mas quem primeiro fez as observações na obra foi o patrocinador. Reclamou da espessura e da má organização dos textos. Quando comecei a folhear cuidadosamente o livro, notei outras falhas: páginas da folha de rosto, da dedicatória, de agradecimentos, de sumário e da apresentação estavam numeradas. Portanto, sem seguir as normas técnicas. Além disso, não havia ISBN. O livreto só existia para mim, os coautores e poucos amigos que ganharam a obra de presente.

Essa foi a minha primeira experiência com livros e resolvi partilhar para aqueles que queiram publicar. Existem muitas prestadoras de serviços por aí se passando por editora, oferecendo serviços de quintal. Mas há muita editora séria no mercado que trabalha com pequenas tiragens. Cabe aos interessados fazer uma pesquisa cuidadosa antes de enviar um original.

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Vendedor de livros


Pião atendia alguns clientes e demonstrava euforia, muitas vezes forçada, tão comum entre os vendedores. Ele me avistou, acenou com a mão e disse:
— Pião, quer alguma coisa?
— Não Pião. Por enquanto não! Tenho algo para mostrar a você.
— O que é? Este livro de minha autoria. Ele será muito útil para os seus filhos, pois, como eles estudam; irão precisar.
— É, Pião, eu não enxergo quase nada sem óculos. Mas como o Pião sempre tá por aqui; vou ajudá-lo. Não custa nada demais ajudar um amigo.
Dito isso, foi à gaveta, tirou R$ 10,00 e pagou o livro. Saí e parti para outro estabelecimento, desta vez uma miniperfumaria. O proprietário, quando me viu, foi dizendo:
— Depois vou lá para acertamos aquele negócio.
— Ora, não se preocupe. Quando você puder, apareça. Mas não vim aqui falar deste assunto. Estou aqui para lhe oferecer este livro de minha autoria, que lhe falei outro dia.
— É, deixe-me ver.
Eu o observava, enquanto ele folheava o livro. Depois, fez um pequeno comentário sobre a obra. Mas ele me surpreendeu com uma indagação súbita e violenta:
— Foi você mesmo que escreveu este livro?
— Sim, fui eu. Por quê?
— Por nada!
Abriu a carteira, tirou R$ 10,00 reais, ficou com o livro e disse:
— Sempre que houver um tempinho, irei ler.
A ele nada disse, apenas o agradeci e me fui com a pergunta dele pendurada nos neurônios.
Dezembro de 2006.
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28 de mai. de 2011

Rascunho 1

Vai dos meus olhos e deles vêm a onda chamada amor
Quebrando-se delicadamente nos meus pés…
Acontece que Posêidon revoltado estar,
Agitando-se e agitando as ondas desse mar
E muitos  rostos púberes não sabem nada-r

Do frágil desamor
Do mártir úmido
De um coração incolor.

No peito está sepultada a bomba
em fibras pulsantes de uma Hiroshima…
Destruiu a luz, roubou a flor
e, por fim, matou a boba
no cogumelo atômico do amor.

Rascunhos, 1999.
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22 de mai. de 2011

A compreensão do conhecimento

 
"A vida sem reflexão não merece ser vivida"
Sócrates

 Estive pensando estes dias nas incertezas que me vêm à cabeça sem que eu espere ou queira. As incertezas da Ciência, do Céu, do inferno e da Política. Pergunto a mim o que faço aqui, neste mundo que perdeu a graça diante das minhas retinas fatigadas pela incompreensão do homem pelo homem.

Os meus pés dormem dentro do tênis ou sapato. Às dores o acompanham, os passos pisam com força as calçadas. O meu peito não precisa de clichês para expressar os infortúnios, as pegadinhas que estão na vida e dela fazem parte. 

Sei que depois do cansaço a gente se depara diante do espelho e vemos o quanto somos ínfimos, atrasados, doentio. Eu gosto do espelho porque ele revela a cada dia que as pessoas se vão, que outras virão. Que por trás deste vai e vem há esqueletos. Todos, um dia, perderemos o sorriso, os dentes, a alegria. Apenas nos restarão as quedas e as farmácias. A gente busca coisas, nomes, soluções para os problemas; mas a vida chega em um ponto e para.

O mundo anda conturbado, arrotando, vomitando todo tipo de violência. Não cabe a gente se curvar ao entretenimento açucarado enquanto o mundo cambaleia por aí, principalmente no campo político. Esse é um período em que Sócrates nos convida a vivermos a compreensão do conhecimento.

Sinta-se convidado a conjugar o verbo viver para que a vida tenha reflexão.
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