20 de fev. de 2011

O vilão

Estou cursando uma pós-graduação. Nos encontros, debatemos assuntos voltados para a área de educação e, nesses debates, incluímos a política. Neste ponto, as opiniões discorridas me faz pensar no fazer político deste país. 

A visão política neste âmbito é deturpada porque o sistema político e a maneira de se fazer política são vistas de cima para baixo, reforçando a ideia de que a Política é a grande vilã da sociedade. 

Usam-se muito as expressões “dinheiro nas cuecas, nas meias; todos calçam 40”,e assim por diante. E elas vêm carregadas de revolta, sempre seguida de uma opinião midiática, catada da tv, dos jornais e revista on-line ou impressos. 

Raramente se fala na compra e venda de votos que acontece em todas as esferas do sistema. Preferem a acidez da crítica. O comércio eleitoral não é analisado nas células do Estado, mas na esfera midiática. Isso não é bom. 

De nada adianta os alaridos das esquinas, dos assentos, das lágrimas. 

De nada servem as trombetas da mídia quando se faz o estardalhaço desse ou daquele gatuno. 

Enquanto a consciência dos que dormem não despertar, não há motivos para espanto, surpresas quando o Congresso se empanturra com os cofres públicos, o cidadão desfalece na fila do SUS, a segurança pública permanece caótica e a educação capenga. 

Uma reeducação política é necessária para que o poder que emana do povo perca a condição de mercadoria e retome o seu papel social que é dar sentido a democracia.
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9 de fev. de 2011

O problema do amor

O problema do amor é que as pessoas o fantasiam.
O problema do amor é que as pessoas criam imagens e perspectivas do objeto amado.
Elas nunca se preparam para a dor.
Nunca se preparam para a decepção, como se o amor fosse um estado de graça permanente.
O problema do amor é que as pessoas o idealizaram e esqueceram que ele é concreto.
E por ser concreto é incompreendido.
O problema do amor é que ele é dual. Digo, não é único; torna-se único
É de carne e osso.
Não é só carne, só osso. São duas carnes, dois ossos.
Esse é problema do amor.

LIMA, Ronaldo Pereira de. Agonia Urbana. Rio de Janeiro: Litteris Ed: Quártica, 2009.

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22 de jan. de 2011

O troco

Esquentou, durante toda a manhã, a cabeça por causa da miserável burocracia pública; aborrecendo-se principalmente com as infelizes informações desencontradas que o punha em um estado de nervos paranóico.

Após toda essa coisa medíocre, seguiu para uma agência bancária. Nela, esperou na fila com o estômago doendo, a alma e os pés. Somente uma daquelas figuras envelhecida, ouvindo em um celular e cantando aquelas músicas de camelôs piratas o fez rir.

Ao chegar sua vez de ser atendido, a bancária nem olhou em sua face. Pediu-lhe o boleto, pôs na máquina para fazer a leitura do código de barras, disse-lhe o valor (que ele já sabia) e o esperou pagar. Com o dinheiro em mãos, calou-se, deu a ele o comprovante de pagamento e chamou o próximo cliente. Sem sair da fila, disse:

— Moça, o troco!

— Só são R$ 0,20.

— Moça, meu troco. Já paguei impostos demais nessa repartição e nem água tem para beber. Quero o meu troco!

— Mas eu não tenho aqui!

— Mas eu quero o meu troco!

A bancária, que se chamava Léia, amarrou a cara, voltou-se para a sua colega e a pediu emprestado os centavos. Algumas pessoas olharam para eles, outras sussurraram. 

Ele, no entanto, saiu com esta reflexão: “Ela queria se apropriar do meu dinheiro como se tivesse pago a minha conta. Acha que o setor público nos prestam simples favores, fazendo de desentendida. Eu poderia até deixar o troco, mas ela se apropriou da minha vontade de decidir, sem ao menos perguntar se eu poderia deixar ou não os centavos.”
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20 de jan. de 2011

No alto do Cariri

O carro de som convocava, em nome do candidato, eleitores para mais um roteiro eleitoral. As caras saiam estampando adesivos nos peitos e bandeiras, seguindo para o lugar onde costumavam se reunir. 
No posto, os caminhões, caminhonetas, vans, ônibus, micro-ônibus e motos iam se amotoando para receber ordens de gasolina. Enquanto eram abastecidos, havia bebida, euforia, batuque, aperto de mãos, vitória certa. Abastecidos, partiram pela BR-101. Das janelas dos ônibus, micro-ônibus, carros populares, caminhões e caminhonetas, eles carregavam estandartes com alegria, regojizo, paixão que, para mais tarde, tornar-se-iam um tormento, uma frustração.
Chegaram ao seu destino. Os eleitores desceram, foram por uma senda, atravessaram um riacho de águas da cor da terra, subiram uma ladeira empolgados e eufóricos com a campanha, entraram pela única cancela do povoado; espalhando-se pela pequena rua de barro.
No lado direito da rua, a uns cinco metros; havia uma casa de taipa cercada por estacas e arames farpados. Pedi ao dono se podia urinar. Ele disse que sim e foi cortês comigo. Adentrei na saleta e em sua parede me deparei com um monte de santos. Fui pelo corredor e vi apenas um fogãozinho à lenha, a cama coberta com um lençol de retalhos e alguns badulaques. Como não havia sanitário, urinei sob um pé de mangueira. Ao retornar, dei fé de um poço artesiano e por cima dele havia umas peneiras e nelas, traíras, carás...
 Saí, agradeci, alcancei os demais e percebi glutões, falácias pálidas e magérrimas. Aquela casa de taipa se contrastava com o verde, a brisa, o céu, as intenções dos candidatos. Enquanto caminhava com a turba, tinha uma certeza única: as eleições iriam passar, mas as cercas e casas que formavam a rua continuariam a mesma, assim como os calções; precisando de remendos.

Colégio, 28.07.00
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14 de jan. de 2011

Biana

Uma boca tão linda

Mas cancerígena

Uma pele tão suave

Mas cheia de fumaça

Às mãos tão macias

Mas cheias de nicotina

A roupa que era tão

Mas tão cheia de fumaça

A vida cheirando a câncer
A fumaça.
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23 de dez. de 2010

Urbano coração

Agonia nos cantos da casa, nas esquinas das ruas, nos ângulos do mundo.

O mundo anda, corre, embriaga-se, cambalea no espaço sem rumo; 
humilhando corações humanos que não são mecânicos.

E os homens, meninos, saem pelados pelas ruas;
correm, cansam-se, morrem e explodem de pressão.

Por isso, chora, chora
Meu irmão no urbano coração.

Cadernos, 1996.
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17 de dez. de 2010

Ladinos

Há pessoas que a sociedade ver como cultas, respeitadas, honestas com as suas coisas, mas quando se trata das coisas públicas elas são desonestas, ladinas, larápias, gatunas. Por isso, ficam no cio, preferem a mancebia da canalhice e da corrupção.

E quando elas estão conectadas no mundo político, violentam direitos sociais e individuais sem nenhum pudor para que seus desejos sejam saciados, nem que para isso velhas amizades sejam esquecidas e deixadas para trás; tornando-se verdadeiros sepulcros caiados, expressados com o velho tapinha nas costas.

Quando contrariadas, costumam observar seu opositor de soslaio. De uma forma ou outra procuram macular a imagem daquela ovelha que se tornou negra, pelo simples fato de não mais compactuar de ideias vis e gatunas. Agarram-se a prepotência, impondo-a no andar e dizer quando se depara com aquele que se tornou seu desafeto. Só que essas infelizes esquecem que são empregadas eletivas. Para elas todos tem que fazer parte das coisas da “família”, pois, argumentam que “todo homem tem seu preço”.

Porque vivem, convivem com as maracutaias feito amuletos supõe que todas as pessoas do seu ciclo de amizade deve aceitá-las naturalmente. Aqueles que se recusam e se opõe, torna-se inimigo a ser perseguido e combatido. Para elas o termo corrupção faz parte do cardápio dos brasileiros.

Mas no silêncio e no miolo do pote, as práticas delas corroem a alma de remorso e solidão quando sabem que as necessidades básicas do povo não são atendidas por causa da barganha, das falcatruas, das notas negociadas, da patifaria. Amordaçados pela facilidade que a coisa pública propicia, degustam o mel da impiedade.

Infelizes sejam aqueles que se regozijam com essas práticas.
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