1 de jun. de 2010

Receitas A4

Euforia, paixão, gritos estrídulos moviam-se no calor das passeatas de rua em rua. As bandeiras são verdadeiros estandartes. Os eleitores quando se deparam com pessoas de outro grupo, as recepcionam com vaias e os mais afoitos com gestos obscenos. O líder nada faz, mas demonstra certo sarcasmo.
Passada essa fase de comícios e pede-pede de votos, chega a semana da eleição. Os grupos se reúnem para traçar os pontos estratégicos do comércio eleitoral. Os líderes convocam os cabos eleitorais, discutem o que deve ser feito e começam agir, geralmente na calada da noite feito ladrão. Mas são os últimos três dias da eleição que as coisas acontecem e esquenta. As pernas dos eleitores são substituídas pelo frenesi dos pneus. São uns atrás dos outros para “impedir” a compra e troca de votos.  
No dia as coisas aparentemente são calmas. A polícia, o MP (quando não escolhem um grupo) ficam na espreita tentando muitas vezes impedir a famosa boca-de-urna. Mas o vício é miserável e muitas vezes difícil de perceber, detectar. A criatividade é algo que acontece, pois, usaram nesta última o cachorro quente (retiravam o miolo do pão e punham dinheiro).
O resultado da eleição é divulgado, os vencidos se trancam em casa, as ruas são tomadas de novas passeatas, as músicas das campanhas são escancaradas, provocações são ditas para todos os lados e muita bajulação. Passada a essa euforia do dia cinco, a chateação perdura por alguns dias, novas caras aparecerem nas repartições acompanhadas de assédio moral, as promessas não cumpridas dão lugar as esculhambações; os que tinham esperança de um emprego perdem-na.
As vidas são retomadas.
Mas aquele mesmo eleitor que se cansou nas passeatas, nos transportes precários, que bebeu bebida ruim, que ganhou intrigas; vai à unidade de saúde, consulta-se e o médico em ¼ de papel A4 prescreve a medicação. O eleitor sai, vai à farmácia da unidade e de lá sai desapontado porque falta remédio. Com a receita na mão, sai desesperado a casa do prefeito (a), mas nunca o (a) encontra em casa ou na prefeitura. Mesmo assim, não desiste, caindo no bolso do vereador, antecipando a venda do voto que, na maior parte dos casos, não é vantajosa para quem compra; assim eles alegam.
Essa é uma demonstração de muitas do comércio eleitoral na base política deste país. Base essa construída sobre areia.
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26 de mai. de 2010

Ao meu corpo que foi de pó


Foi a palavra na ponta dos dedos.

Foi a briga do peito, a espada das incertezas...

Foi o esqueleto na ponta dos pés, as mãos tocando as árvores, a fruta que o intervalo chamou.

Foi a serpente de cima de uma árvore, a luz que surgiu, os olhos que se abriram.

Uma coisa nova surgiu, na calma e na alma.O céu parou, o livro se abriu, as portas se fecharam e um novo mundo surgiu.
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14 de mai. de 2010

Dia, depois noite

É dia.

Levadas pelo vento, elas se mesclam ao anil do céu. O sol, por sua vez, esbanja-se pelas ruas, calçadas. Depois vem a noite, sem nuvem alguma; mas carregada de estrelas.

Mas de repente as nuvens mudam de cor, os trovões surgem, os relampagos fazem faltar energia, Mimi foge para debaixo da cama e Zeinha se assusta, dizendo que o coração palpita na boca.
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8 de mai. de 2010

A vela


A vela só é vela enquanto não acesa.

Depois de acesa, o pavio alimenta a flâmula.

Depois, logo depois, o pavio se vira e apaga-se; as trevas recaem como no último fôlego e a chama sai sem pressa numa fumaça.

Ela se foi e outra se acendeu.
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Um após outro


Um dia chama outro, puxa outro, engravida
E pari a velhice.
Um dia abraça outro, estende a mão para outro
Mas se encolhe sem a outra.
Um dia beija outro, morre sem o outro
Morre sendo dia
.
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5 de mai. de 2010

Reeducação política

O problema da política não estar nos políticos, mas no modo de se fazer política, de se pensar a política e de escolha política.

Neste país, faz-se política de várias maneiras: pela aparência, pela picuinha, pelos interesses pessoais e egoístas, pelo comércio eleitoral, pela mídia, pela mentira, pela fofoca, pela antipatia etc. Explico: conversava outro dia sobre a eleição presidencial. Ouvi o nome de Dilma ligado ao de Lula, o de Serra ao de FHC. Os simpatizantes do primeiro argumentavam a crise superada, a não dependência do FMI, as não privatizações, os inúmeros concursos públicos etc. e os do segundo diziam que o Plano Real foi criação dos tucanos, o Bolsa Família (Uma mentira, porque o Bolsa Família é a reunião do Vale Gás, Bolsa Escola e Vale Transporte criados no governo de FHC), o não reajuste das aposentadorias (O fator previdenciário foi criado no governo FHC), que o governo Lula já pegou a casa arrumada e outras bobagens.

Quando os ânimos se apaziguaram, eu olhei para os meus amigos e lhes disse: minha candidata ao cargo de presidente é Marina Silva. Uns me tacharam com estas frases: “Eu é que não voto numa mulher feia daquela”; “Ela não vai ganhar mesmo. Não gosto de votar para perder!” Os mais estúpidos perguntaram: “Quem é Marina Silva?” Tentei explicar, por meio da história de vida dela, sua conduta ilibada, sua capacidade de refletir as causas sociais, sua carreira política, seu preparo para assumir o cargo de presidente da República. Mesmo assim tive que ouvir de estúpidos dos estúpidos que “não votaria em mulher”. Mesmo assim continuei argumentando. Expus as falhas do governo Lula e suas péssimas coligações, assim como mostrei as falhas do governo de FHC que não nos dava dignidade, rezava, lia e falava muito bem a cartilha norte-americana (E não americano, como querem muitos). Por último, disse-lhes que o governo Serra é péssimo por causa de dois fatos simples: os confrontos entre as polícias civil e militar no ano de 2008 e a recente greve dos professores no estado de São Paulo, recepcionada por cassetetes da polícia militar. E concluo: se alguém não se abre para o diálogo para duas peças fundamentais de uma democracia que é a segurança e a educação, como administrará um enorme e complexo país como o nosso?

Após a minha exposição, uns se dispersaram, outros se calaram. Outros assuntos foram abordados. Quando estava sozinho, pensava sobre no que disse, o que eles iriam pensar a respeito e fiz esta reflexão: uma pessoa má educada (não importa se seja analfabeta ou carregue um diploma universitário) conjuga das mesmas ideias de corrupção quando fazem péssimas escolhas, para depois reclamar nas esquinas.

É necessária uma reeducação política, assim como se prega bastante a reeducação alimentar e ambiental. Sem essa reeducação, sempre haverá péssimas escolhas, péssimos candidatos, políticas ruins e excludentes.

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23 de abr. de 2010

Multiplicando os pães


A multiplicação dos pães continua, a exemplo de dona Lucádia que divide R$ 510,00 para a farmácia, o mercadinho, à água, o botijão, a energia e os netos.
 
Isso acontece todo dia cinco de cada mês. Os filhos dela chegam acompanhados dos seus filhos. Ela, dona Lucádia, observa para os rostos pequenos das crianças e se compadece. Afinal de contas, são filhos dos seus filhos. Contrita, ela os acolhe solidariamente com a solidariedade que só às mães possuem.

E é assim: em alguma parte deste país a multiplicação dos R$ 510,00 acontece miraculosamente para uma multidão de netos, de filhos, genros, noras; sem rumo, sem remo.
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