15 de set. de 2022

A princesa de olhos azuis

 

Anastácia

RESUMO 

A Princesa de Olhos Azuis é uma história curta que conta a vida de Anastácia. Dividida em seis partes, a história nos mostra o sofrimento que a escravidão causava nos negros, como eles eram capturados, os castigos recebidos pelos senhores de engenho, como se deu a mistura das crenças, a cultura que eles trouxeram e que influenciaram a vida do brasileiro até hoje.  Propriá, SE. 1997. Vídeo assistido na Escola de 1º e 2º Graus Joana de Freitas Barbosa. 

A PRINCESA DE OLHOS AZUIS

ÁFRICA – 1801

Haviam tribos inimigas por todas as partes. Mas, em uma delas, havia uma festa de compromisso, uma festa de casamento. Lá estavam, entre árvores frondosas e rios claros, alegres e contentes; esperando o dia em que Ojú Urum e Ode Eby casariam. Costumes religiosos, tradições, paz e felicidade. Oxum é o padrinho, bem acolhido e glorificado.

Pegos de surpresa por tribos inimigas, a tribo de Ojú Uru é massacrada. O desespero espantava os pássaros, a morte causava dor. Não imaginavam que homens haviam atravessado o Oceano para buscar mercadorias de olhos, orelhas, pernas e mãos.  Só paz e alegria reinavam em seus corações, bulia nas danças, nos rituais folclóricos. Homens súbitos, diferentes e cheios de escorbuto; invadem, massacram física e piscamente aquelas nobres pessoas. Carregavam dentro de si o racismo e outras tantas ideias pífias e medievais. Muito sangue, muita morte e destruição. Ode Eby é assassinado, esposo da princesa dos olhos azuis.

BRASIL – 1820

Ojú Uru, princesa, foi reduzida a condição de escrava. Seus olhos azuis guardavam aquele filme fétido e barbudo. Uma onda de dúvidas agitavam seu espírito e a lançava para fora em lágrimas. Aprisionada em condições inumanas, foram levados no tumbeiro para o outro lado. Um país enorme e lindo, mas não para eles. O choque das culturas os humilhariam ainda mais.

Chegando ao Brasil, são tratados como animais pretos. Olham seus dentes, dão-lhes o valor necessário. Não tinham alma. Era assim o modo de ver escravista. Em seguida, um certo fazendeiro ficou atraído pela princesa. Tinha uma postura diferente, uma placidez forte nos olhos. Além de uma beleza simples que a punha numa posição de destaque.

O fazendeiro a separou. Pagou a quantia e se foi.

NA FAZENDA

 Na fazenda o padre já esperava os pagões. Era preciso batizar conforme a bula afirmativa do papa Inocêncio IV. Por ser o dia de Santo Anastácio, Ojú Uru ficou conhecida como Anastácia. Tudo estranho ia entrando em sua vida: a língua, um nome e a cor que os tornava seres para toda sorte de trabalho forçado que não está nos anais humanos. Esta é a página da História: negra e sem linhas, manchada de sangue que não se apaga jamais.

A maneira dócil de Anastácia e a energia íntima do seu ser levou os negros da senzala crerem que Olorum (deus dos deuses) enviou um princesa de olhos azuis para os confortarem.

Os feitores eram pessoas cruéis, vencidos por uma ideologia paupérrima e religiosa. Eram sem olhos. Não respeitavam a cor branca na barba dos negros, seus cabelos. Eram traços físicos expondo uma metamorfose. Para quê? Eles não entendiam, viam-nos como “animais pretos, sem alma”, segundo o papa Inocêncio IV.

NA SENZALA

Na senzala existia o sinal do catolicismo, comprovando a sua participação na escravidão, impondo uma religião à força, na marra. O objeto era escravizar a consciência negra que chorava pela África. Porém, é um catolicismo camuflado, vencido pelos orixás que governava a vida dos negros.

Um dos feitores, tendo um atrito com um negro, leva-o para o tronco. Grandemente ferido e com os lábios queimados, é levado para a senzala. Anastácia cura-o, causando espanto e murmúrio. Sua vida de santa negra surge na vida de todos. O pavor, a reverência domina-os. Aí teve início o primeiro milagre.

Intenso era o sofrimento. Muitos morriam comendo areia entre os pés de cafezais, aos pés dos seus senhores. Tal era o pesar que os conduziam a África em delírios fortes e agonizantes. Sonham, sonham...

ANASTÁCIA LIBERTA OS ESCRAVOS

Decorridos alguns dias, Anastácia é assediada pelo seu dono. Como havia falado: Anastácia não só possuía beleza íntima, mas física, despertando qualquer faísca de fogo sob a carne. Ela recusa e o feri. Sai correndo e liberta os escravos, ficando na Casa Grande. No outro dia os libertos são caçados por capitães-do-mato e Anastácia ganha uma mordaça.

Capturada as presas, Anastácia vive e se comunica por telepatia, fortalecendo-os. Na senzala, os deuses africanos foram quebrados e os deuses católicos são retirados. Neste intervalo de tempo ocorre um fenômeno que atemoriza os feitores e ao senhor de engenho. Depois, Anastácia realiza várias curas. Anastácia é afrontada por um padreco que procurava no exorcismo a fé medíocre. Ele condena-a, com toda sorte de praga; considerando-a uma bruxa. Só a morte era digna dela.

ANASTÁCIA CURA O FILHO DO SEU SENHOR

Os dias se iam. A mordaça no pescoço causou uma hedionda ferida e Anastácia ia indo embora, carregando a dor na cor na pele. Durante este intervalo de dias, o filho do seu senhor adoece do pulmão, sem cura. A senhora entra em desespero, aliás, o desespero entrou na senhora e o amor ao filho vence a fé que aprendera, o racismo e humilha-se diante de Anastácia, a quem tanto aborreceu. A raça superior encurva-se, humilha-se com clemência e perdão, pedindo que seu filho fosse salvo.

Anastácia não recuou. Curou o menino pondo suas mãos escuras sobre um corpo branco; mesclando assim as cores da gente. A mordaça é retirada e os escravos soltos. Para ele só os quilombos sobravam. Não havia espaço para eles nas cidades.

Anastácia faleceu. Primeira negra santa não popular. É considerada e respeitada em toda a Bahia. Faleceu por liberdade, vida e justiça. Os seus contemporâneos e descendente acreditam que Da Oi Vê tá no céu

 

 

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18 de jul. de 2022

Cleno Vieira - Chico, o Velho

Cleno Viera, poeta, estudante do curso de Letras Vernáculas. UFS/SE.
Livro Chico, o Velho. 1 ed. -- Porto Real do Colégio, AL. Plima Edições - Novela – Literatura Brasileira.

Foi com imensa alegria que recebi pelos Correios o presente livro do escritor, professor e amigo Ronaldo Pereira de Lima, carinhosamente chamado de Ron Perlim. A temática central, o sofrimento do rio São Francisco, o querido Velho Chico, mas também a simplicidade com que vive os ribeirinhos de Porto Real do Colégio, nas Alagoas, um verdadeiro manifesto em prol destes que são por demais desvalorizados, marginalizados e até mesmo, excluídos do debate político lá na capital federal, Brasília.

Hoje, não se vê, diante de tantas urgências que o Brasil protagoniza, uma discussão que trate a problemática desde seu princípio ao mais complexo detalhe. Passamos por contratempos, onde, sob o controle da nação, são propagados e instrumentalizados uma forma odienta no Estado brasileiro, o nosso Velho Chico, mais uma vez, infelizmente ficará para trás.

Tendo em vista todos os problemas supramencionados, faz-se necessário, além de sua leitura, uma ampla divulgação deste livro e de outros manifestos em prol do São Francisco (e de seu povo), principalmente nos meios mais populares de comunicação, nas instituições de ensino, sejam elas públicas ou privadas e se ainda possível for um maior acolhimento da obra por parte dos centros e academias literárias da região, e assim promover o desejo de Germano e seus amigos pescadores, “Apenas estou pensando no povo simples que vive do Velho e depende dele para sobreviver.”

Além da discussão central, chamou-me atenção a descrição que o autor faz do porto de Propriá, cidade que também é margeada pelo Rio. Ron não se esquivou em descrevê-lo como realmente é na realidade, pode até não ser no período festivo do Bom Jesus, mas que certamente na maior parte do ano é assim que recebe seus visitantes e acolhe o Velho: “Sem o que dizer, foram cabisbaixos até a cidade de Propriá. Ela os recepcionou com um bueiro, bolsas plásticas, orelhas-de-burro, um cavalo morto, latas de refrigerantes, cervejas, roupas, sandálias e um cheiro insuportável de fezes ao pé do cais.”

Claro, que o bueiro depende de outros esforços para ser bloqueada sua atividade, ou ao menos “amenizada”, o cavalo, sua presença pode até ser rara, mas o restante dos obstáculos podem e devem ser evitado e/ou enfrentados diariamente pelos milhares de propriaenses, que não sabem, ou fazem pouco caso da mais legítima verdade, não haverá: não haverá Propriá, muito menos Colégio, sem a presença do querido e amado Velho Chico, nosso irmão.

Aracaju, 15 de julho de 2022.


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13 de jun. de 2022

Antônio FJ Saracura - Chico, o Velho

Antônio FJ Saracura

CHICO, O VELHO, Ronaldo Pereira Lima, digo, Ron Pelim, por volta de 60 páginas, Edições Plima, 2022, romance ambientalista, isbn.

Meses atrás, Ron me enviou o manuscrito (modo de chamar) de pequeno romance e me pedia para ler e dizer o que achava. Eu faço isso com meus livros antes de publicar e Ron tem sido um parceiro e tanto, oferecendo sugestões valiosas. Abracei o pedido, e nem pensei em mudar o rumo do trem, que não era o caso, apenas botei gotas de azeite nas conexões dos trilhos, que secariam com um sopro, se assim quisesse o autor.

Estou orgulhoso de ter participado um pouquinho desse bom trabalho do Ron, um ganhador de prêmios literários. Fui seu companheiro em um deles, o Secult de Literatura de 2010, último infelizmente, promovido pela Secretaria de Cultura do Estado de Sergipe. Ele, com o livro infantil “Laura” e eu com “Minha Querida Aracaju Aflita”, que ainda vive e goza de boa saúde.

Chico, o Velho” fala dos pescadores e de suas famílias ancoradas na beira do Rio São Francisco, ali em Porto Real do Colégio nas Alagoas... Tentando pegar o peixe do dia, prosando embaixo dos pés de benjamim, sugando o mel da cana chamador de sonhos. O livro é um álbum de fotos vivas e revela o dia a dia desse povo, o jeito de pensar e de agir: remendando redes, espalhando armadilhas e sempre a cultivar os laços da camaradagem. E usa as técnicas naturais para corrigir os desvios de comportamento, descartar a maçã podre e preservar a harmonia.

A prosa é leve e reveladora. Mesmo que o leitor espere o fato acontecer, ele é mostrado com uma beleza natural que encanta.

Ele se calou. Não tendo o que responder, voltou o rosto para o teto e observava a teia de aranha. Nisso, sua mulher punha a mesa. Nela, estavam dispostos feijão, farinha e três postas de tilápias sendo que, a maior estava destinada para ele. A mesa estava composta por quatro crianças, uma mulher pálida e um homem revoltado. Joaquim, o filho mais velho, o espiava. Atreveu-se com uma pergunta simples e breve, mas sem resposta. Por cima do prato uma mosca voava. Com uma das pernas sobre a cadeira estirou a mão oleosa, pegou o peixe e mordia-o com veemência”.

Após o leitor assimilar a alma do meio, desfilam capítulos de antológicos. Ron Pelim preocupa-se em revelar paisagens e almas em ação em seu mundo decadente. Os detalhes literários pouco importam. E assim, “Chico o Velho” é do tamanho desse povo que vive do rio e se queixa de que o amigo está escondendo o peixe farto.

Seria uma denúncia?

Seria um pedido de socorro?

Quem está destruindo o rio, fazendo com que os peixes se escondam nas profundezas onde moram os duendes marinhos também assustados?

Quem pode socorrer os pescadores do São Francisco se os eleitos para cuidar dessa parte nem ligam para seu povo e nem para o rio. Que morram! Certamente outros aparecerão na seção eleitoral.

Aracaju, 09 de junho de 2022, por Antônio FJ Saracura.

 

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