Luiz Ruffato |
No
seu primeiro romance “Eles Eram Muito Cavalos”, você de alguma forma tentou
trazer para o público, uma São Paulo que muitos não querem ver ou sua intenção
quando escrevia a obra era outra?
São Paulo é o sexto maior aglomerado urbano do planeta, com
cerca de 20 milhões de habitantes. Uma metrópole onde a segunda maior frota de
helicópteros particulares do mundo sobrevoa ônibus, trens e metrôs que desovam
trabalhadores em estações superlotadas; traficantes ricos instalados em suas
mansões leem nos jornais notícias sobre traficantes pobres perseguidos pela
polícia corrupta e violenta; políticos roubam a nível municipal, estadual e
federal; as vitrines dos restaurantes chiques refletem os esfomeados, os
esfarrapados; rios apodrecem em esgoto, lama, veneno; favelas enlaçam prédios
futuristas; universidades de excelência
alimentam a próxima elite política e econômica, enquanto na periferia, escolas
com professores mal remunerados, mal formados e mal protegidos geram os novos
assalariados; a mais avançada tecnologia médica da América Latina assiste,
impassível, à fila dos condenados à morte: homens vítimas da violência,
mulheres vítimas de complicações do parto, homens e mulheres vítimas da tuberculose,
crianças vítimas da diarreia; muros escondem a vida miúda que escorre lá fora.
Como transpor o caos dessa cidade para as páginas de um livro? Penso que o
ficcionista deveria ser assim uma espécie de físico que ausculta a Natureza
para tentar compreender o mecanismo de funcionamento do Universo.