6 de out. de 2018

Cinderela das cinzas

Como naquela época não havia eletricidade, a menina vivia no fogão à lenha e na lareira, dia e noite, limpando as cinzas deixadas pelo fogo. É por isso que foi apelidada de Cinderela, nome que remete a cinzas. Outro apelido era Gata Borralheira, porque ela parecia uma gata, se metendo nos cantos da casa, fazendo limpeza, borrada de cinzas. 

CANTON, Katia. Era uma vez Perrault. 1ª ed. São Paulo: DCL, 2005. p. 63.
 
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20 de set. de 2018

Jurado no Colégio NSG e Blogueiro da Aplacc


28.08.2018 - O escritor Ron Perlim se tornar blogueiro da Aplacc (Academia Penedense de Letras, Artes, Cultura e Ciências). Em seu blogue, foram publicadas duas crônicas e dois artigos de opinião. Eis os links:


31.08.2018 - A convite do Colégio Nossa Senhora das Graças, na cidade de Propriá/SE, o escritor participa como jurado do II Concurso Literário com o seguinte tema: Tricentenário da Paróquia de Santo Antônio em Propriá - trezentos anos de fé, História e Religiosidade. O Evento ocorreu no auditório daquela instituição.

Jurado - banca 04

Certificado de participação

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Geraçao do grito


Crianças e adolescentes correm, gritam, gritam e gritam em frente da casa por pirraça. Na maior algazarra, xingamentos e confusão entre eles; nos impedem de ler, conversar e ouvir música.
Volta e meia comentava dentro de casa:
Que meninos chatos! Como gritam! Acho que é de propósito que eles fazem isso.
Parece que sim, respondeu minha mulher do computador.
Cansado de pedir para que eles brincassem sem fazer tanto barulho, fui surpreendido várias vezes com boladas na porta e na garagem. Irritado, dei-lhes umas broncas, fazendo-os se dispersarem. Mas eles voltavam no outro dia com ímpeto, fazendo a minha vizinha da frente assistir à novela preferida no quarto. Eu não iria me por de joelhos para eles.
Incomodado, não organizaria a minha mudança. Então, dei-lhes novamente broncas e mais broncas até que um deles arguiu, dizendo:
A rua é pública.
Eu repliquei:
É pública, mas vocês não têm o direito de usar o espaço público para incomodar.
Ouvi vaias e porrotes.
No outro dia, no mesmo horário, eles voltaram. Sem aguentar as bombas juninas fora de época, a vizinha estourou: “Saiam da minha porta, se não, vou para o promotor”.
A ameaça dela surtiu efeito. Pouco a pouco eles se dispersaram.
Eles deram um tempo e quando retornaram, vieram encapetados. É provável que vieram assim motivados, até porque um deles disse em alto e bom som:
Eu sou criança e o Estatuto da Criança me protege.
Eu repliquei:
O Estatuto protege a criança e o adolescente, mas não manda vocês virem para a porta das pessoas para fazerem bagunça. Só prá vocês saberem: eu tenho três exemplares aqui. Quem de vocês querem um de presente?
Todos eles se calaram, teimando, teimosos. Não tive alternativa a não ser filmar, gravar, fotografar a rebeldia deles, fazer um relatório e denunciá-los ao Conselho. Houve pais que esbravejaram, aquietando-se depois.
Se fossem respeitosos não precisariam de nenhum adulto dando palpite em suas criancices, muito menos de um Conselho.

Fonte: https://blog.aplacc.org.br/ronperlim/2018/08/28/geracao-do-grito/. acesso em 20/07/2018.
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29 de ago. de 2018

Jurupari ou Tupã?


Jurupari, o senhor do culto mais vasto, comum a todas as tribos, filho e embaixador do Sol, nascido de mulher sem contato masculino, reformador, de rito exigente e de precauções misteriosas, foi depressa identificado como sendo o Diabo. Cinquenta anos de catequese espalharam para Jurupari o renome satânico.  Além das crianças ensinadas das escolas, os catecúmenos, os índios de serviço, a população europeia, acordes em ver no velho deus indiano uma grandeza infernal, a multidão dos mestiços, mamelucos, curibocas, massa plástica, sugestionável e de imaginação ampla, divulgou o novo papel de Jurupari. No século XVII já o Filho do Sol, o Dona dos Instrumentos, o Senhor dos Segredos, evocado ao som dos maracás simbólicos, era, da cabeça aos pés e definitivamente, o Diabo, o Cão, o Belzebu, o Satanás, o Demônio.

Achado o inimigo, faltava o aliado. Ao mesmo tempo que o combate se dava aos seguidores de Jurupari surgia um trabalho intenso e admirável para assimilação de um deus ameraba nas condições de corresponder a noção católica do Deus-Pai, o Iavé dos hebreus. Era preciso encontrar na teogonia ameríndia um ser incolor, sem cultos e ritos que o tivessem comprometido às exigências teológicas, sem fazer mal nem bem, infixável, informe, nebuloso, ignorado em sua doutrina, um legítimo “Deus Desconhecido” dos gregos na decadência, esperando, nas alturas do infinito, a voz de São Paulo para defini-lo e dizer-se embaixador de seu nome.

Os jesuítas da catequese, todos os elementos religiosos do Brasil colonial, localizaram esse Ser providencial para que o indígena o amasse e não fosse obrigado a adorar um deus alienígena, em Tupi. Para o índio, Tupã começou a ter culto prestigiado pela força dos brancos enquanto Jurupari era perseguido por todos os meios e maneiras. O Pajé recuava batido e com ele a crença se dissolvia no âmago das matas para conservar-se, até hoje, atestando sua espantosa vitalidade espiritual. Tupã fez parte de todas as orações e aulas. O padre Manuel da Nobrega, Anchieta, Aspilcueta Navarro, Abbville, Thevet, d’Evreux compõem versos, catecismo, peças dramáticas, hinos, em louvor exclusivo de Tupã, Deus verdadeiro, aparecido para contrapor-se ao falso Jurupari dos infernos e salvar as almas para a eternidade paradisíaca.

Como compreendia o indígena a Tupã, e como este se tornou Deus-Pai dos cristãos? A impressão que me ficou de todas as leituras feitas nos documentos dos séculos XVI e XVII, lendas e tradições indígenas, vocabulários e relatórios, é que Tupã é unicamente um trabalho de adaptação da catequese. O Deus cristão tomou a forma ou melhor, deu a forma a uma entidade que nunca possuíra significação religiosa para nenhuma tribo do Brasil.

(...)

O grande deus popular, deus intermediário, para os índios do Brasil era Jurupari que foi crismado em Diabo, o Princípio do Mal. Tupã é uma criação erudita, europeia, branca, artificial. Seu culto foi dirigido pelos padres da catequese. É o Princípio do Bem. Nada mais lógico que essa tática dos jesuítas, por todos os títulos admiráveis, em frente ao absorvedor prestígio de Jurupari.
Tupã, deus que fala pelos trovões e vê pelo caracol dos relâmpagos e raios, é tão literário como o Júpiter-tonante, acastelador de nuvens e marido de Juno.

(...)

Era Tupã o que os folcloristas ingleses chamam Nature God, personificação abstrata de forças cósmicas, com atuação meteórica, sem interferência na vida sublunar. Pertencia à fase inicial das religiões. Era um elemento que Durkheim dizia préanimiste. Lévi-Bruhl escreve que, nas sociedades primitivas, todas as funções de relação são funções de presença de seres sobrenaturais. E como toda participação tende a ser representada nos fenômenos meteorológicos, que deviam impressionar maiormente aos indígenas, era natural que certos seres fossem apontados como dirigindo o trovão, o raio, o relâmpago e a chuva (...).

CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia dos Mitos Brasileiros. 2ª ed. São Paulo: Global, 2002. pp. 58-60.

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